Seis pistas que relacionam as emoções à satisfação profissional

15 março 2018

A imensa maioria dos professores constata todos os dias o papel crucial que as emoções possuem em sua atividade profissional. Preocupação, conflito, satisfação, afeto, carinho, esperança, frustração ou desespero são algumas das experiências que o docente pode vivenciar em um dia de trabalho, seja com os alunos, famílias, diretores ou alguns colegas.

É importante destacar que as respostas emocionais dos docentes podem ser diferentes em relação a situações similares. A personalidade de cada professor, as experiências anteriores e as metas que propõe para a atividade docente têm um papel muito importante. O que para um significa conflito e a expressão da degradação da educação, para outro é algo próprio do trabalho docente que deve ser resolvido para melhorar o aprendizado dos alunos ou o funcionamento da escola.

Mas não é apenas cada professor que reage de maneira específica perante as situações geradoras de emoções. O contexto educacional no qual o professor realiza seu trabalho também influencia a forma de responder aos desafios que são propostos. Por um lado, nas escolas situadas em entornos mais desfavorecidos, existe um maior risco de situações complicadas contínuas. Por outro lado, nas escolas que possuem uma boa liderança e cultura de colaboração, aumenta a probabilidade de que um professor passe por um conflito com menor custo afetivo.

1. A influência da história pessoal e profissional

A personalidade do docente se manifesta habitualmente de forma similar em sua vida social, familiar e em sua atividade profissional. Além disso, as duas esferas manifestam uma estreita interação. No entanto, também é necessário levar em conta que os motivos, os projetos e a história profissional do docente, modelados por sua vez pelo contexto educativo no qual desempenha o seu trabalho, influenciam as emoções vivenciadas na tarefa educacional. Por isso, não é estranho encontrar ocasionalmente reações emocionais diferentes nas esferas sociofamiliar e educacional.

2. O relacionamento com os colegas

As relações positivas com os demais professores, ou ao menos com boa parte deles, é a dimensão mais importante para se sentir motivado e satisfeito com o trabalho educativo. Não é apenas pela gratificação gerada por essas vivências positivas, mas porque são elas que contribuem em maior medida para que o professor enfrente com segurança as tensões que são inevitavelmente produzidas com os demais setores da comunidade educacional.

Alguns anos atrás, Hargreaves (1988) descreveu quatro esferas nas quais essas vivências se concretizam: reconhecimento, apoio, cooperação e confiança. A ausência de um ou de todos esses elementos conduz a uma crise da autoestima do docente, a uma perda progressiva do sentido do trabalho e a um crescente isolamento.

Essas quatro esferas dependem também da própria competência do docente, de sua participação nas tarefas comuns e de sua capacidade de estar disponível e de colaborar com os demais.

3. As relações com os alunos

A demanda de ensinar melhor a todos os alunos, durante sua permanência no sistema educativo até pelo menos os 16 anos, aumenta as exigências aos professores. As diferenças sociais, culturais, pessoais e acadêmicas que os alunos manifestam em classe tornam ensinar e orientar mais difícil que antes.

Os alunos disruptivos ou com problemas de conduta costumam gerar as vivências mais negativas aos professores. A dificuldade de gerenciar esses conflitos afeta não apenas o trabalho habitual do docente com a classe, mas também a sua própria estabilidade emocional. Essas situações são uma boa prova para verificar a competência emocional do docente e o apoio que recebe dos colegas.

Também existem emoções positivas e continuadas na tarefa docente. Possivelmente a mais relevante é a satisfação pelo progresso dos alunos, quando os docentes comprovam que seus alunos alcançam as metas esperadas ou que os mais atrasados, desmotivados e conflituosos avançam e retomam o processo de aprendizado.

Junto com essa satisfação, o reconhecimento dos próprios alunos do trabalho positivo feito pelo professor também tem um papel emocional inquestionável. Uma experiência que é ainda mais poderosa quando alguns deles, depois de anos, demonstra agradecimento porque fomos importantes em suas vidas.

4. O relacionamento com as famílias

Uma das tarefas que os docentes devem realizar para favorecer a educação de seus alunos é a colaboração com as famílias. A satisfação ou insatisfação com essa relação depende de múltiplos fatores: as características das famílias e dos professores; as crenças sobre o papel de ambos na educação e no processo de ensino e aprendizagem; além do estilo de relação que se se estabelece entre eles. Quando essa relação é considerada complementar e se estabelece como colaboração e troca de experiências e propostas, costuma ser mais gratificante do que quando a crença dominante se baseia em que a família deve aceitar as recomendações transmitidas pelos docentes.

Nessa troca de perspectivas e expectativas, o filho/aluno tem um papel importante. Seu aprendizado, comportamento, relacionamento com os colegas e docentes, além do cerne da família, assim como as informações que transmite afetam a dinâmica emocional que está presente nas relações entre a família e o docente.

A colaboração com lealdade, confiança e responsabilidade entre os docentes e as famílias é uma fonte de satisfação profissional. Quando o contrário ocorre, a ausência de comunicação, a dificuldade de chegar a um acordo ou o esquecimento de compromissos alcançados fazem com que os docentes se sintam desgostosos e indefesos, especialmente se verificam os efeitos negativos dessa situação no aprendizado dos alunos.

5. A micropolítica na escola e o impacto das reformas

Determinadas tensões que os docentes vivem provêm dos conflitos no centro educacional para conseguir mais influência ou para atingir uma melhor situação profissional ou melhores condições de trabalho. É o que alguns anos atrás Ball (1989) chamou de micropolítica na escola. Por mais que seja algo habitual em todas as organizações, não deixa de ser desagradável às vezes. Apenas quando existem meios estabelecidos aceitos por todos para resolver os conflitos é possível limitar e até evitar seus possíveis efeitos prejudiciais.

Os programas de reforma das administrações educacionais também oferecem risco de inquietação e temor. Essas reações emocionais costumam ser produzidas em grande medida pela falta de informação e pela desconfiança dos docentes se tais reformas têm apoio e meios suficientes para melhorar a qualidade do ensino e as condições de trabalho.

6. A disposição e as condições para enfrentar os conflitos

As reações emocionais dos docentes derivam, como já apontamos na primeira pista, da disposição do docente, de seus motivos e projeto. Além disso, dependem também da cultura escolar e, dentro dela, da cultura emocional. As atitudes e o relacionamento entre os professores, suas expectativas, compromissos, formas de colaboração, relações com a autoridade e suas atividades compartilhadas configuram, em grande medida, a cultura emocional de uma escola.

Entre todos os fatores que podem contribuir com a coesão, cumplicidade e colaboração em uma escola, podemos destacar um: a confiança. Por meio dela se gera segurança, satisfação nas relações pessoais e o aumento da autoestima, o que permite enfrentar com maior tranquilidade os desafios habituais da profissão docente. Dessa forma, a identidade profissional vai sendo construída paulatinamente.

Na tarefa de construir uma cultura emocional nas escolas, que seja baseada na colaboração e na confiança mútua, a ação da diretoria exerce um papel fundamental, assim como a dos próprios docentes, que devem ser conscientes de que a preocupação pelo bem-estar dos demais é o melhor caminho para o bem-estar pessoal.


Álvaro Marchesi é Catedrático de Psicologia Evolutiva e Educação na Universidad Complutense de Madrid. Foi Diretor Geral e Secretário de Estado da Educação do Ministério de Educação da Espanha de 1986 a 1996, bem como Secretário Geral da Organização dos Estados Ibero-americanos de Educação, Ciência e Cultura – OEI de 2007 a 2014. Escreveu inúmeros livros, a maioria deles traduzidos para o português no Brasil.

Referencias

  • BALL, S. 1989. La micropolítica da escuela. Hacia una teoría de la organización escolar. Barcelona: Paidós: MEC.
  • HARGREAVES, A. 1988. The emotional practice of teaching.Teaching of teacher education. 14 (8), 835-854
  • MARCHESI, A. 2007. Sobre el bienestar de los docentes.Competencias, emociones y valores. Madrid: Alianza